quinta-feira, 9 de junho de 2011

Falar do amor



Falar do amor é como falar da morte,
é como falar de um anjo de trevas e luz
ancorado num mar de silêncio,
é como falar de ti
e das ervas que bordejam os caminhos da montanha,
os caminhos que levam à loucura.

Tudo nos é permitido meu amor,
na condição de nada querermos.
Tudo nos é permitido porque tudo nos é proíbido,
é preciso entender.

A suavidade dos corpos é uma armadilha doce, tão doce,
até para aqueles que, como nós,
já não sabem descer ao poço do desejo
sem levar com eles a consciência,
essa ave negra.

Imagino-te presa das ondas desse mar que convida à morte
à morte ou ao esquecimento,
que é uma forma de adiar a morte
e de a tornar mais próxima dos sentimentos.

Imagino-te sem te ver,
estendida ao sol
sob os olhos daqueles que não sabem ver,
presa tu também do fascínio do céu reflectido nas águas
ou nos olhos das gaivotas
que, lá do alto, traçam o rumo das estrelas.

É preciso cortar a luz com as mãos,
retê-la um instante
e, depois, libertar o seu aroma de ervas e pinheiro manso.
É preciso saber viver
e não nos demorarmos demasiado aí.

Falo-te das fadas e das crianças,
que são fadas prematuras,
falo-te das pedras boreais
e dos corpos caídos junto ao mar
falo-te do supremo silêncio
que é um grito disfarçado.
Falo-te assim, com palavras,
como se fossem gestos.
Mas não são,
e eu sei-o e tu também.


Benidorm, Julho 1989
JC

Sem comentários:

Enviar um comentário